Do xadrez aos exames na Faculdade: chegou a batota hi-tech (com citação de Mourinho)

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Welcome to All ! ツ / Pixabay

Xadrez e ensino superior unidos por motivo improvável. Do caso do vencedor do mundo aos exames em Portugal: “Damos aulas há 30 anos e nunca vimos isto”.

O xadrez está sob xeque. Não mate, mas perto disso.

A Sinquefield Cup, um torneio nos Estados Unidos da América, apareceu nas notícias em diversos pontos do planeta porque há suspeitas de batota.

Hans Niemann, um jovem de 19 anos, quase ignoto, derrotou o melhor jogador do mundo, Magnus Carlsen – que já não perdia há 53 duelos e lidera o xadrez a nível mundial há mais de uma dez.

Posteriormente essa partida da terceira ronda, Magnus Carlsen anunciou que iria desistir do torneio.

Sem justificação.

Exclusivamente recordou José Mourinho, numa frase do treinador português em 2014: “Prefiro não falar. Se disser o que sinto, terei problemas” – na profundeza, Mourinho queixava-se da equipa de arbitragem num jogo do Chelsea.

Do outro lado, o vencedor Hans Niemann comentou: “Deve ser embaraçoso para o vencedor mundial perder com um idiota uma vez que eu”.

E o “idiota” pode ser mesmo um idiota – no sentido de ter ideias “fora da caixa”.

É que Hans Niemann já foi expulso de um portal de jogos de xadrez online, por chamada de vídeo, por ter utilizado um computador para estudar os movimentos do oponente.

Hikaru Nakamura, sexto melhor jogador do planeta de concórdia com a tábua mais recente, foi directo: “Acho que o Magnus Carlsen acredita que o Hans Niemann fez batota. Mas não há provas“.

O próprio Hans Niemann reagiu a estas sugestões, depois o jogo da ronda seguinte, rejeitando qualquer truque proibido: “Eu foco-me no xadrez há anos, estudo. Fiz jogadas arriscadas, resultaram“.

O portal Big Think também afasta as suspeitas de batota. Porque os computadores não “pensam” uma vez que os humanos. Porque Niemann “merece o mercê da incerteza” e simplesmente foi melhor neste duelo.

E apresenta uma hipótese que considera mais provável: alguém da equipa do vencedor mundial era um “espião”. Cada jogador de xadrez de topo tem equipas que o preparam para cada jogo – e alguém dessa equipa de Magnus Carlsen pode ter pretérito informações, estratégias para o oponente.

Até porque, pergunta o Big Think, “se um jogador utilizasse um computador para o ajudar num torneio de xadrez, uma vez que é que iria receber as instruções em directo, durante o jogo, em frente ao seu oponente?”

Há alunos em Portugal que respondem a essa pergunta.

Ouvir respostas durante fiscalização

É que a “batota tecnológica” não se fica pelo xadrez. Nem pelo desporto.

Já chegou ao ensino. E já chegou a Portugal, pelo menos às universidades portuguesas.

O primeiro momento peculiar relatado ao ZAP por uma professora universitária – que preferiu manter o anonimato – aconteceu há alguns anos.

O estreante foi um aluno que “parecia que estava a rezar” durante um fiscalização. Estava a falar sozinho e num volume muito subalterno.

“Começámos a olhar uns para os outros”, relata a professora. Mais tarde, recebeu a indicação (muito provável) de que o aluno estaria a ouvir as respostas ao fiscalização durante o próprio fiscalização.

Uma vez que? Tinha um dispositivo muito pequeno disposto no ouvido, que só saía com um íman. Ou seja, estaria com um microfone ligado a um telemóvel – ambos escondidos – dizia as perguntas e ouvia as respostas pelo tal auricular minúsculo, também ligado ao telemóvel através de bluetooth.

(cá está uma resposta à questão do Big Think.)

“Mas não conseguimos provar zero. Ele podia alegar que estava a ler o enunciado para ele próprio, há alunos que fazem isso”, recordou a professora.

No ano lectivo pretérito, o proporção de sofisticação aumentou. Novamente durante um fiscalização.

Um aluno começou a levantar a folha de enunciado na vertical, uma vez que se estivesse a fazer o movimento de um scanner. A sua camisola estava a ajudá-lo.

“Comecei a encontrar estranho, fiquei com a sensação de que tinha uma câmara no peito, que estava a filmar as perguntas. É que já me tinham dito que há óculos da Google ou canetas que conseguem filmar. Agora ter um dispositivo na t-shirt…é mais complicado interpretar”, relata.

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A professora passou a estar mais atenta ao aluno, também por outro motivo: achou “muito estranho” o aluno ter começado a responder a diversas perguntas de escolha múltipla em poucos segundos.

Ou seja, os primeiros instantes do fiscalização terão servido para o aluno mostrar todas as perguntas a alguém no exterior, através da câmara minúscula.

Havia de facto alguém a proferir respostas ao ouvido: “Em momentos de maior silêncio, percebemos que havia uma voz dentro da cabeça dele (risos). A resposta era transmitida por alguém, ao ouvido. E começámos a estar sempre perto dele”.

Resultado: “Nas primeiras 20 perguntas, acertou 19. A partir daí, uma vez que estávamos perto dele, errou mais. Não conseguiu passar porque detectámos. Senão, teria pretérito”.

O problema para os professores – e imitar é mesmo uma espécie de ódio de estimação para muitos docentes – é que dificilmente evitam estes sistemas tecnológicos. Há regras que impedem um travão a estas novidades.

“Não sabemos uma vez que combater isto. Já combatemos as canetas, que agora têm de ser fornecidas por nós no momento do fiscalização. Entregam o telemóvel quando entram na sala – mas podem levar dois telemóveis. E não pode possuir revista. Nem podemos mexer no bolso, ou tocar no aluno. Também não dá para bloquear o sinal, o aproximação à rede. É proibido”, enumerou a docente.

Perante regras que dificultam esse combate, a própria professora tenta combater, da forma que consegue: “Os alunos são obrigados a desligar completamente os telemóveis. Se houvesse telemóvel ligado, tinha forma de detectar. Eu própria andei com o meu telemóvel, a andejar pela sala, a ver se detectava alguma rede. Não detectei zero”.

Quando chega a profundeza de emendar os exames, aí é fácil ver se houve esquema: “Se vários alunos escrevem precisamente a mesma frase, notamos. É que chegamos ao ponto em que está uma pessoa no exterior a dar resposta a seis pessoas ao mesmo tempo. Vimos seis exames muito semelhantes, as mesmas respostas correctas e as mesmas respostas erradas. Respostas certas é resultado de quem estuda. Respostas erradas serem iguais…é estranho“.

No entanto, fica (ainda) mais complicado travar estas batotas quando há um site que vende estes dispositivos para rezar, auricular praticamente invisível. E o site explica uma vez que o esquema funciona e deixa evidente: “Nascente dispositivo é o melhor para copiarem em exames”.

“Damos aulas há 30 anos e nunca vimos coisas assim”, lamenta a professora.

Desistência no reencontro

No dia seguinte à vitória sobre Carlsen, Niemann foi revistado ao pormenor antes de estrear a jogar. Telemóveis, auriculares, transmissores de rádio… O corpo inteiro foi revistado. Zero foi encontrado.

Nesta segunda-feira houve reencontro entre Magnus Carlsen e Hans Niemann. Desta vez num jogo online, na Julius Baer Generation Cup

O melhor do mundo realizou uma jogada…e desistiu. Desligou a câmara de vídeo e não voltou.

Carlsen voltou a jogar no mesmo dia, no mesmo torneio. E apareceu. Sem qualquer termo sobre o que tinha feito.

  Nuno Teixeira da Silva, ZAP //

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